domingo, 7 de fevereiro de 2021

QUE ESPERAIS, SOLDADOS DE PORTUGAL?

 Soldados de Portugal! A pergunta é claramente feita a todos vós.

Com efeito, de que estais à espera?

Venho falar-vos em tom frontal e que nada tem de macio, como é próprio do meu carácter, temperado nas lutas do Ultramar. Um jeito que me acompanha desde o berço e que creio nunca haver desmentido ao longo de uma vida que já soma 75 anos. Tom este que vos é devido, porque assim o exige a vossa estatura, uma estatura firmada na dignidade de quem empunha armas. E, principalmente, sem nunca esquecer aquele dia radioso, dia entre muitos abençoado por Deus, no qual cada militar teve a subida honra de beijar o estandarte nacional, e proferir juramento solene de defesa da Pátria enquanto no peito lhe restasse um sopro de vida.

Sei que o juramento de qualquer de vós saiu puro e límpido, como o foi o de cada um de nós, que vos precedemos e ficámos marcados pelo timbre de honra próprio de quem ostentou ou ostenta, até à morte, o sublime título de Soldado de Portugal. E por isso é que senti a obrigação indeclinável de vos endereçar as palavras, que seguem, com a confiança ajustada àqueles que, sem discriminação de patentes ou de postos, passámos por casernas ou cobertas de navios.

Armada! Exército! Força Aérea! Em todos estes ramos, estais vós, Soldados de Portugal, e nenhum há de quem não me considere camarada de armas. Estou persuadido que será recíproco o sentimento – o tempo nem sempre afasta; também pode unir!

É certo que corre, entre nós, uma larga diferença de geração. Acabo de dar a entendê-lo. É a única? – Hesito em afirmá-lo, porque não me repugna conceder que vos avantajais em virtudes militares. Já por aqui, é Portugal quem ganha!

Ficai cientes de uma coisa. Do que é meu propósito escrever, nada lereis que se desvie do que respeita ao objectivo de alcançar o bem comum para a nossa Pátria. Por isso, vos confessarei:

Nunca tive em grande conceito a política que vigora em Portugal. Para ser mais autêntico: sempre a olhei com horror. Porém, no grau de desalinho, a que chegámos, atingi o ponto de desprezar, como nunca, a forma; o sistema; e o regime instituído. Conheço apenas Portugueses. Esses perfilam-se em primeiro lugar e são eles que têm prioridade no serviço que é imperativo moral prestar-lhes. O mais – partidos; Constituição; sonoros princípios vertidos em Declarações  salpicadas de um colorido mais ou menos forte – de uma ponta à outra, tudo isso são abstracções!

Com a franqueza e lealdade, que procuro pôr em todo o meu proceder, sustento que já é tempo suficiente de esquecer felonias e deslealdades perpetradas no passado. Doravante, é altura de congraçar a família portuguesa e dedicar-lhe todos os nossos cuidados. Não sei de outro caminho digno de trilhar, se queremos, como é certo que ambicionamos, a salvação de Portugal e do seu martirizado povo!

A desgraça política pode abater-se de dois modos sobre uma comunidade humana: uma das vias é a tirania; a outra é a do vazio de poder, num grau em que periga a paz pública. Terrível ameaça pesa sobre a nossa Pátria. Só não a pressente quem está adormecido, e sonha com dourados horizontes que não virão. Qual destas duas calamidades é a que se ajusta à hora que Portugal vive?

No íntimo, não hesito em inclinar-me para o que segreda a minha consciência, já bastante familiarizada com estes fenómenos: abrem-se as portas de um estado caótico! Contudo, ao nosso futuro pouco importa o sentido em que vai resolver-se o que ainda é, por ora, uma incógnita – tirania ou anarquia. Na verdade, tanto faz, porque qualquer dos defechos será uma tragédia.

Assistimos a um temível aviso. À míngua de uma capacidade governativa lúcida e edificante, por conta de um perigo público – talvez imaginário – solta-se uma actividade legiferante, extensa e confusa, o que constitui o pior dos males para quem dirige os destinos de uma nação, porque é a revelação tácita de um estado próximo à impotência de actuar.

No caso presente, pouco interessa que a crise sentida seja ou não exclusiva da nossa querida Pátria. Somos Portugueses e estamos em Portugal. Isto é o suficiente para que os nossos cuidados se virem predominantemente em direcção ao caso nacional. E isto, separado de quanto vai por esse mundo além, requer só por si muito esforço para a sua resolução.

Nestes momentos, quando uma pandemia, real ou fantástica, toma conta da paz de espírito de um povo, indagar por onde é que o veneno entrou, um autêntico veneno, este sim, que vai destruindo fibra a fibra uma sociedade inteira, não parece curial buscar onde está a culpa do presente. Estará no 25 de Abril? Não é causa de tudo, porque ele próprio foi efeito de muitos desvios a uma recta governação! Terá sido o Gonçalvismo? Este delírio foi corolário de princípios que se espalharam, sem tom nem som, pelas trombetas tocadas na madrugada dos cravos, mas esse louco período já morreu, embora soltando, à sua passagem, fortes sequelas dos vícios que transportava! Cabe, enfim, a responsabilidade aos já numerosos governos constitucionais, que se sucedem num interminável processo de acusações preferentemente apontadas ao executivo acabado de derrubar? Não tem de espantar – insere-se dentro de um estilo viciado que faz da política um jogo de bola cá-toma lá, praxis que constitui a quinta-essência dos chamados Estados de Direito Democráticos, transformando-se naquilo para que a sua génese os impele – uma pugna insana de tricas partidárias!

A reacção à pandemia parece desmentir o invocado vazio de poder. Anda muito tolo iludido com este cortejo de anúncios emitidos por órgãos que são ou levianos ou criminosos.  À volta disto, descanse quem quiser – embora faça mal porque dali não sai mais do que fumaça e pó. Aguardemos que o fumo se evole e a poeira assente, e logo veremos em que acaba a tão festejada resposta.

A ser correcta a análise, dos que sustentam que há cada vez maior prepotência por parte de quem manda, teríamos que este quadro, dentro e fora de fronteiras, logo descobriria a estratégia de que tudo se prepara para a construção de um único governo à escala mundial. Objectivo que ainda tardará, mas que indubitavelmente já fulge, há muito, nos horizontes de esperança das correntes mais revolucionárias.

Estranha-se é que não se extraia o que será talvez a mais valiosa lição da apregoada pandemia. Realmente, enquanto ela dura e perdura, não consta que alguém, de bom senso, se tenha atrevido em buscar refúgio noutro ponto da Terra. E custará a crer que tal venha a suceder, porque a alegada situação de catástrofe é de risco em todos os quadrantes. Do mesmo modo, será a situação política sob um só governo para todo o género humano: qualquer homem insatisfeito com a sua sorte no lugar em que vive, nada ganhará mudando de sítio. Ainda que o autorizem, continua a sujeitar-se a idêntico regime, se não for mesmo uma cópia fiel daquele ao qual procura escapar.

Ora isto também nos toca. São duas, pois, as ameaças que pairam sobre  Portugal: o projecto do governo mundial, que tal como se desenha não deixará de ser tirânico; e o já aludido risco de se cair no vazio de poder. Quanto a mim, Soldados de Portugal, o perigo mais próximo vem do último lado. Com efeito, antes de fugir ao amontoado mais disforme, deve Portugal salvar da sua mutilada soberania nacional, aquilo que ainda for possível restaurar. Depois, cuidaremos do resto.

Entretanto, não me vereis debruçado sobre cada um dos filhos espúrios de um embuste que é brutal e quase sacrílego, porque nesta impostura ferve uma união desnaturada que escarnece de preceitos sagrados. O futuro se encarregará de revelar a autêntica face da pandemia, e mais uma vez lembrar às pessoas uma lição sábia e tão velha quanto o homem: a voz dos poderes públicos nem sempre é eco da Verdade! E por Verdade entenda-se que não é só verdade injuntiva a que deriva de uma lei humana, como também e, maxime, a que nos vem de leis acima do ius quod in ciuitate positum est. Esta traição, ao que é verdadeiro, verifica-se em especial quando os poderes públicos são aqueles que temos pela frente. Estes poderes, adulterados na sua génese e na causa final, destapam agora as suas chagas e já não conseguem esconder que se esboroam pouco a pouco. Tiveram o desplante de gritar aos quatro ventos que tinham alcançado êxito no combate à COVID-19 – foi o estertor do moribundo, e trouxe à memória os últimos dias do Estado Novo. É um brilharete montado às três pancadas num pingarelho palco de feira, que abana por todos os cantos, anunciando inequivocamente final de acto que não é de comédia, porque trágicos vêm sendo os resultados.

Já se viu que foi sol de pouca dura, se é que, de facto, rompeu as nuvens. Nem a vitória lhes interessava. Depressa lançaram mãos à cabeça, e deram o dito por não dito. Com verdade, desta vez? – Vá-se lá saber! Se de uma ponta à outra, tudo isto não é contrafacção, será porque 2 e 2 já não somam 4.

Não viverá muito aquele que não for testemunha de como esta manobra preordenada se reconduz a uma estratégia de desastre moral e ruína material.

Os mercados de capitais – barómetros crónicos da saúde que transpiram as economias de todo o planeta – depressa hão-de reflectir a chegada de uma travessia do deserto bem custosa de cobrir. Por outro lado, assiste-se a uma impressionante vulgarização de caracteres. Sintoma este inquietante porque, além de ser de muito mais difícil cura, é talvez o principal motivo da decadência que atirou com muitos para o lânguido torpor de uma modorra. Desta modorra não se despertará sem gravosas penas no trajecto a percorrer, ao que se terá de juntar uma profunda e sincera conversão individual, sendo esta a exigência de mais dificultosa observância. Contudo, todos sabemos que Portugal já emergiu de outros períodos de agudíssima prostração moral, e fê-lo em beleza. É esta certeza que deve manter intacta a nossa fé num porvir de renovados triunfos!

Com este discorrer, voltamos à iminência de um vazio de poder, ou seja, de um estado anárquico que é a mais pavorosa das tiranias em que pode tombar a sociedade. Este risco permite que se actue sem o escrúpulo de levar em apreço a eventual bondade do poder que vai desaparecendo, a qual bastaria para lhe conferir a requerida legitimidade e retirar licitude a qualquer movimento insurreccional. Ao dizer que o risco, ora vivido, consente que se avance, fiquei aquém do que era minha obrigação deixar exarado. Esta a razão pela qual corrijo a falta declarando que, perante a proximidade de um poder que se está sumindo, há não só o direito como recai ainda, sobre todos quantos prezamos Portugal, o dever de agir sem tardança. E selo as minhas palavras apoiado no que dispõe a lei humana e, acima dela, a lei natural!

Que modelo se propõe?

Uma vez que se dá um vazio de poder, em são rigor de Justiça, torna-se obrigatório devolver ao povo a titularidade da soberania como causa material que dela é. Mais até do que um seco imperativo de Justiça, o processo flui ex rerum natura. E assim congregado nos seus organismos naturais, o sujeito político que responderá a esta pergunta será, portanto, o povo português. Família; autarquias geográficas; corporações da inteligência, das artes e do trabalho; enfim, todos aqueles micro-universos, onde é incontroverso que se sente palpitar a vida nacional, serão chamados a pronunciar-se sobre o destino a seguir. Por estas vias, se ouvirá a voz de tudo que é vivo e está abertamente definido, sem nada de simulado ou de diferentes artifícios metidos pelo meio!

Como remate deste apelo, acrescentarei: atravessamos tempos de indefinição; no ar, respira-se um clima de angústia.

Quem é culpado deste panorama desolador? – A bem dizer, quase todos: uns, tentando recuperar algum equilíbrio que, porventura houvessem tido, lá vão imperando com uma já minguada força; os restantes porque, cada vez mais submissos e vergonhosamente dóceis ao mando acabado de denunciar, consentem no desaforo presente.

Fala-se em mais uma medida restritiva de direitos básicos e das mais sãs liberdades que nenhum poder político tem autoridade para condicionar: ou o que se ordena é bom, ou não há maioria que possua legitimidade para o impor. Porém, para quem não perdeu ainda o sentido das proporções, o rochedo, que ameaça tombar sobre as nossas cabeças, mais parece um seixo que a penha temida.

De uma forma mais comezinha, o alarde feito confunde-se com as vascas da agonia de quem teima em exibir uma força já inexistente. No entanto, é ponto líquido que atemoriza o comum das gentes num grau que não anda longe de uma psicose colectiva. Tanto basta para que estejamos atentos e de prevenção.

Na soberania, convém distinguir entre a prepotência do tirano e o governo que gera uma situação  bem próxima da anomia generalizada. Pegue-se-lhe por onde se queira: o certo é que, num e noutro caso, a revolta ganha justificação.

A hora, que passa, exige: recolhimento; reflexão; e, por fim, actuar em conformidade.

A vossa acção, Soldados de Portugal, preencherá a parte de menos extensa duração na regeneração da Pátria. Mas constitui, certamente, a mais nobre, a mais elevada e, direi mesmo, a mais decisiva contribuição da obra necessária, na linha do que já é apanágio na vossa tradição de servir sacrificadamente, um longo sofrer onde se misturam incontáveis glórias. Só convosco, nem tudo fica feito; mas, sem vós, nada se faz. Como quase sempre aconteceu e se espera agora que volte a suceder uma vez mais, tendes pois a missão de imprimir forma e dar  rosto visível ao corpo social. Do mais, se encarregará a dinâmica da vida com os olhos postos na meta ideal. Essa meta é o cofre precioso que está guardado no seio impoluto da Pátria estremecida.

A mim, camaradas de armas – que assim vos chamei no início do brado de socorro aqui formulado e desse modo não deixei de vos tratar ao longo do que proclamei, porque é como o sinto – a mim, insisto, só me resta ser admitido a partilhar convosco a apetecida honra de engrossar a hoste salvadora da grei portuguesa!

VIVA PORTUGAL!

 Joaquim Maria Cymbron

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